Oscar consagra ‘Argo’ em noite marcada por excesso de números musicais
Filme de Ben Affleck é coroado em cerimônia com barbadas, surpresas, um raríssimo empate e muita música; veja a lista completa de ganhadores
Luísa Pécora
Conforme o esperado e conrariando as estatísticas, “Argo” , de Ben Affleck, ganhou o Oscar 2013de melhor filme, tornando-se o primeiro longa desde 1989 a conquistar o prêmio sem uma indicação a diretor . Neste ano, a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood decidiu distribuir as estatuetas entre várias produções, com “As Aventuras de Pi” levando o maior número de troféus – quatro, incluindo direção para Ang Lee.
O cineasta taiwanês recebeu seu segundo Oscar mais ou menos da mesma forma como recebeu o primeiro, em 2006. Naquele ano, Lee ganhou diretor mas seu “Brokeback Mountain” perdeu a estatueta principal para “Crash – No Limite”, no que até hoje é considerado um dos maiores erros da Academia. O tempo vai julgar se tratamento igual será dado a “Argo”, um thriller bem-feito, mas menos contundente que alguns de seus competidores.
O Oscar fechou a bem-sucedida e inusitada trajetória de “Argo”, um filme que em janeiro tinha sido riscado da competição principal após não conseguir a indicação a diretor para Ben Affleck – vencedor de praticamente todas as demais premiações de Hollywood. Desde o início da cerimônia, a Academia se esforçou para “corrigir” o que tinha feito. “Eles sabem que erraram feio”, disse o apresentador Seth MacFarlane sobre a esnobada a Affleck, que mais tarde chamou de “multitalentoso”.
Affleck estava muito feliz ao aceitar o prêmio de melhor filme ao lado dos coprodutores Grant Heslov e George Clooney. Falando de modo acelerado, ele disse que quando ganhou seu primeiro Oscar (pelo roteiro de “Gênio Indomável”, em 1998), “era uma criança que não sabia o que estava fazendo”. “Nunca pensei que ia voltar”, afirmou. “Mas aqui estou.”
Vitórias (e empate)
Nas demais categorias, a principal surpresa foi o amor da Academia por “Django Livre” . Considerado um concorrente menor, o filme levou melhor roteiro original para Quentin Tarantino eator coadjuvante para Christoph Waltz , que bateu os favoritos Tommy Lee Jones ( “Lincoln” ) e Robert De Niro ( “O Lado Bom da Vida” ). O austríaco, que ganhou o mesmo prêmio há três anos por “Bastardos Inglórios”, também de Tarantino, chamou o diretor de “herói”.
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Um dos resultados mais interessantes da noite foi o da categoria edição de som, que deu empate – apenas a sexta vez em que isso aconteceu nos 85 anos do Oscar. O prêmio foi dividido por Per Hallberg e Karen Baker Landers, de “007 – Operação Skyfall” , e Paul N.J. Ottosson, de “A Hora Mais Escura” , única vitória do longa sobre a caça a Osama bin Laden que em certo momento chegou a ser favorito à estatueta principal. Michael Haneke levou melhor filme estrangeiro por“Amor” e “Valente” bateu “Detona Ralph” na categoria animação.
Algumas barbadas se confirmaram, entre elas o prêmio para Daniel Day-Lewis, de “Lincoln”, que se tornou o único a vencer três vezes na categoria melhor ator . Aplaudido de pé, ele fez o discurso mais elegante da noite, brincando com a apresentadora Meryl Streep, fazendo um bonito agradecimento à mulher, Rebecca Miller, e dedicando a estatueta à mãe. Day-Lewis também fez questão de tecer elogios ao diretor Steven Spielberg, o maior perdedor da noite, cujo longa liderava as indicações (12 categorias), mas só levou dois prêmios (ator e direção de arte).
Outra aposta que se confirmou foi a vitória de Jennifer Lawrence , de “O Lado Bom da Vida”, na categoria atriz, vencendo a francesa Emmanuelle Riva, de “Amor”, que completou 86 anos neste domingo e é a indicada mais velha da história da categoria . A empolgação de Lawrence foi tanta que ela tropeçou na enorme cauda do vestido ao subir no palco, o que, segundo a própria, motivou os aplausos de pé da plateia (algo que, de fato, pareceu um tanto quanto excessivo).
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Anne Hathaway preferiu a linha emotiva ao aceitar o Oscar de atriz coadjuvante por seu papel no musical “Os Miseráveis” . “Virou realidade”, disse, em uma referência à canção que interpreta no longa, “I Dreamed a Dream” (“eu sonhei um sonho”, em tradução literal). No final, ensaiou uma mensagem poética dizendo que torcia para que um dia as agruras de sua personagem, que cai em desgraça nas ruas da Paris dos anos 1800, sejam apenas coisa da ficção e não da vida real.
Música, música
Antes, Hathaway já tinha subido ao palco ao lado de grande parte do elenco de “Os Miseráveis” – incluindo Russell Crowe, um desastre vocal – para participar de uma homenagem aos musicais da última década . Foi a mais longa e desnecessária das várias apresentações que seguiram o tema da noite: “a música dos filmes”.
Shirley Bassey cantou “Goldfinger” em comemoração aos 50 anos da série James Bond ; Adele cantou o tema do último filme, “007 – Operação Skyfall”, que lhe rendeu a estatueta de canção original; Norah Jones interpretou outra indicada à categoria, “Everybody Needs a Best Friend”, composta por MacFarlane para “Ted” ; e Barbra Streisand, que não cantava no Oscar desde 1997, apresentou “The Way We Were” após a montagem sobre os artistas que morreram no último ano.
Até aí, tudo bem, mas a homenagem aos musicais podia ter ficado de fora, ou ao menos sido mais curta. Além do elenco de “Os Miseráveis”, Jennifer Hudson e Catherine Zeta-Jones também se apresentaram (esta última, aliás, numa clara dublagem) para relembrar as canções que lhes renderam o Oscar de atriz coadjuvante. Último musical a ser premiado na categoria principal, “Chicago” foi lembrado ainda outra vez, quando o elenco (além de Zeta-Jones, Renée Zellwegger, Richard Gere e Queen Latifah) subiu ao palco para entregar dois prêmios. A volta no tempo foi desnecessária e até constrangedora, já que os produtores da cerimônia, Craig Zadan e Neil Meron, também produziram o filme.
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Para compensar o tempo gasto nos números musicais, foi preciso enxugar outras partes da cerimônia. Tradicionalmente apresentados individualmente, os indicados a melhor filme foram reunidos em grupos de três. Os prêmios de ator e atriz, que nos últimos anos vinham sendo entregues de forma mais pessoal, com textos personalizados para cada um, voltaram ao formato antigo (apenas um clipe). Sem intérpretes famosos, os temas de “Chasing Ice” e as “Aventuras de Pi” que concorriam à canção original não tiveram chance de subir ao palco. E, no pior dos recursos, a orquestra usou música alta e agressiva (como o tema de “Tubarão”), para cortar os discursos dos vencedores.
Teria sido melhor cortar dois dos números musicais de MacFarlane. O primeiro no monólogo de abertura, um dos piores da história recente do Oscar, no qual ele falava sobre as atrizes que já mostraram os seios em filmes (não por acaso, a hashtag #sawyourboobs ganhou forte repercussão no Twitter). O segundo no final, quando todos os prêmios tinham sido entregues e os nomes dos patrocinadores exibidos na tela. Em dueto com a estrela da Broadway Kristin Chenoweth, MacFarlane apresentou uma canção dedicada aos perdedores da noite, citando muitos deles nominalmente e rapidamente caindo no mau gosto.
Nos intervalos dos números musicais, MacFarlane optava por piadas irônicas e autodepreciativas, sem alcançar resultados especialmente satisfatórios. Logo no início, William Shatner apareceu em um telão lamentando que Amy Poehler e Tina Fey, apresentadoras do Globo de Ouro 2013 , não tivessem sido as escolhidas da Academia. Provavelmente era o que todos estavam pensando.
Veja a lista completa de vencedores:
Filme: “Argo”
Direção: Ang Lee, por “As Aventuras de Pi”
Ator: Daniel Day-Lewis, “Lincoln”
Atriz: Jennifer Lawrence, “O Lado Bom da Vida”
Ator coadjuvante: Christoph Waltz, “Django Livre”
Atriz coadjuvante: Anne Hathaway, “Os Miseráveis”
Roteiro original: “Django Livre”
Roteiro adaptado: “Argo”
Animação: “Valente”
Filme estrangeiro: “Amor” (Áustria)
Trilha sonora: “As Aventuras de Pi”
Canção original: “Skyfall”, de Adele, “007 – Operação Skyfall”
Fotografia: “As Aventuras de Pi”
Figurino: “Anna Karenina”
Documentário: “Searching for Sugar Man”
Curta de documentário: “Inocente”
Edição: “Argo”
Maquiagem: “Os Miseráveis”
Direção de arte: “Lincoln”
Curta de animação: “Paperman”
Curta-metragem: “Curfew”
Edição de som: empate entre “A Hora Mais Escura” e “007 – Operação Skyfall”
Mixagem de som: “Os Miseráveis”
Efeitos visuais: “As Aventuras de Pi”